segunda-feira, 24 de maio de 2010

Olhos nos olhos com Clóvis de Barros Filho


Pouco antes de sua palestra no Tênis Clube, CLÓVIS DE BARROS FILHO falou à página. Advogado, jornalista e professor universitário, esteve em Santos para lançar, em concorrido evento da Porto Seguro, o livro A Vida Que Vale a Pena Ser Vivida (Vozes), escrito em parceria com Arthur Meucci. Graduado em Direito e doutor em Ciências da Comunicação pela USP, em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação Social Casper Líbero, mestre em Ciência Política pela Universite de Paris III, simpático e atencioso respondeu às perguntas.

Como é a vida que vale a pena ser vivida?

É sem escrever livros... Eu tenho a impressão de que o fato de escrevê-los e ter de lançá-los torna a vida angustiante. A dificuldade para estacionar o carro e descer a Serra fazem da vida de um escritor algo um pouco atribulado. A nítida impressão que dá é que a vida que vale a pena ser vivida é a do outro, mas isso é um erro muito grande, porque nunca sentimos a tristeza do outro. Na verdade a única vida que pode, mesmo, valer a pena é a nossa.

As pessoas estão preparadas para essa vida?

Não. De certa forma a ambição de eliminar a tristeza faz com que o homem se apegue a muletas de todos os naipes, que supostamente o protegeriam. Estas muletas vão desde as transcendências religiosas até a autoajuda e a qualidade de vida. Fórmulas, escudos, protetores contra o mundo como ele é. Enquanto não abrirmos o peito pra encará-lo e vivermos à mercê desses subterfúgios, passaremos a vida em vão.

O que impede as pessoas de viverem uma vida plena?

O maior obstáculo é não entender a distância entre uma vida boa e uma vida bem-sucedida. As pessoas acabam confundindo as duas e, de tanto buscar o aplauso do outro, acabam se esquecendo de si mesmas e, portanto, da própria vida.

Há algumas ações pontuais que fazem a diferença no dia a dia?
O primeiro passo é a luta sem trégua em defesa da soberania de definição da própria existência. Estamos escravizados por múltiplos senhores, a sociedade nos impõe protocolos, modelos, programas de conduta, padrões estéticos que nos amordaçam, que nos escravizam. Enquanto não conseguirmos encontrar nesse espaço de tiranos um pequeno lugar para nossa soberania, estaremos à mercê de forças que nos transcendem. Estaremos governados pelos outros, e aí a vida será necessariamente fracassada.

Por que tratar a Filosofia como principal objeto da felicidade humana?

A Filosofia tem por objeto a vida boa e talvez patrocine isso quando oferece, a quem se interessar por ela, instrumentos de reflexão sobre o que significa viver. A Filosofia, por si só, não garante vida feliz a ninguém, porém pode permitir entender o que não esperar da vida. Ajuda a reduzir a esperança e, como estou convencido de que uma vida boa é desesperançada, acredito que ela contribua para uma vida melhor.

Qual é a hora de mudar as escolhas?

É qualquer hora em que a vida é vivida. Nunca é tarde ou cedo para viver bem e melhor, nem para refletir e, portanto, filosofar, sobre a própria existência. Não há um tempo. Tudo o que é passado, pretérito e mal vivido é irrecuperável.

Como, então, se preparar para as consequências das mudanças?

Toda a manifestação de um desejo, ou de uma pulsão, obriga a um realinhamento, um desacomodamento do mundo, e isso enseja reação. É preciso saber que ela existirá.

Cite algum preceito filosófico que até hoje continua atual para o bem viver.

Quando Spinozza diz que a alegria é a passagem de um corpo menos potente para um corpo mais potente, que impulsiona para agir e determina o encontro com o mundo, percebo que essa reflexão do século XVII é absolutamente contemporânea e relevante para quem busca viver melhor.

O que você faz para colocar em prática o discurso de seu livro?

Ah, não coloco, não... Eu vivo como qualquer outra pessoa, oscilando entre alegrias e tristezas, mais com tristezas do que com alegrias. Tenho as minhas ilusões e esperanças. O livro é outra coisa.

FONTE: http://www.jornaldaorla.com.br/

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