sexta-feira, 4 de junho de 2010

A disciplina do amor.


Foi na França, durante a segunda grande guerra: um jovem tinha um cachorro que todos os dias, pontualmente, ia espera-lo voltar do trabalho. Postava-se na esquina, um pouco antes das seis da tarde.


Assim que via o dono, ia correndo ao seu encontro e na maior alegria, acompanhava-o com seu apassinho saltitande de volta a casa. A vila inteira já conhecia o cachorro e as pessoas que passavam faziam-lhe festinhas e ele correspondia, chegava a correr todo animado atrás dos mais íntimos. Para logo voltar atento ao seu posto e ali ficar sentado até o momento em que seu dono apontava lá longe. Mas eu avisei que o tempo era de guerra, o jovem foi convocado. Pensa que o cachorro deixou de esperá-lo? Continuou a ir diariamente até a esquina, fixo o olhar ansioso naquele único ponto, a orelha em pé, atenta ao menor ruído que pudesse indicar a presença do dono bem amado. Assim que anoitecia, ele voltava para a casa e levava sua vida normal de cachorro até chegar o dia seguinte. Então, disciplinadamente, como se estivesse um relógio preso à pata, voltava ao seu posto de espera. O jovem morreu num bombardeio mas no pequeno coração do cachorro não morreu a esperança. Quseram prendê-lo, distraí-lo. Tudo em vão. Quando ia chegando aquela hora ele disparava para o compromisso assumido, todos os dias. Todos os dias.


Com o passar dos anos ( a memória dos homens!) as pessoas foram esquecendo do jovem soldado que não voltou. Casou-se a noiva com um primo. Os familiares voltaram-se para os familiares. Os amigos, para outros amigos. Só o cachorro velhíssimo ( era jovem quando o jovem partiu) continuou a esperá-lo na esquina. As pessoas estranhavam, mas quem esse cachorro está esperando?... Uma tarde ( era inverno) ele lá ficou, o focinho voltado para aquela direção.




Lygia Fagundes Telles.

FONTE: http://tudoqueestdentro.blogspot.com/

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